terça-feira, 17 de janeiro de 2017

"O Terrível Capitão América"


*texto publicado originalmente no jornal O POVO em 2012

Tenho muita desconfiança e receio dessa mania norte-americana, à vista grossa da cenográfica ONU, de “assumir as dores de todo o mundo”, feito um indesejado Super-Homem ou qualquer um desses heróis de meia-tigela que sobrevoam os céus de cuecas ao avesso (nunca entendi isso) e o imaginário desse povo ególatra, ruim de geografia, tarado por basquete e que enfeita tudo com gergelim, fritas e bacon.
Os Estados Unidos, num american dream, enriqueceram na base do comércio e fabricação de armas, ou de largos empréstimos para a sua compra, mantendo acesas as guerras e o terrorismo no mundo, cúmplice silencioso em discursos de piece and love,  fazendo o seu próprio terrorismo, o econômico-predatório, o que devasta — sem comida, sem água, sem recursos e sem jeito — os países que nem queremos saber que existem, pois são, em sua maioria, dominados por ditadores broncos, líderes fanáticos, habitados por gente pobre, “atrasada”, não-cristã e doente, repletos de pestes da moda (Aids/Sida, Ébola) ou mesmo as históricas, já extintas nos demais países, e outras novidades do Oriente. Esses povos que, se escaparem de tudo isso isso, ainda lhes restará a fome, a sede, a violência, a humilhação, o desprezo, o estupro, enfim, uma série de mazelas que “não nos dizem respeito” porque somos “emergentes”, já fomos pobres, “zés cariocas”, hoje, não, somos abençoados por Deus e bonitos por natureza, exclusive os milhares de brasileiros que ainda não entenderam direito o tal american way of life.
São muitas as histórias de personagens americanos que, por não agradarem a inteligência pentagonal, acabaram “comendo capim” cedo, geralmente mortos por tiros de um doido que vinha passando na rua e blá-blá-blá. Mistérios indissolúveis do senhor Columbo, via “efibiai”, “siaiei” e “mibi” na série “Acredite se Puder”.
Não vou mentir. Senti-me enojado com o clima de celebração transmitido pela TV mundial, via Casa Branca, após o assassinato do Mister Bin (Osama Bin Laden). Triste o ufanismo daqueles a aguardar a desejada execução e a não surpreendente “vitória” americana — por conta disso, em único dia, o Barack Hussein Obama (nome irônico...) aumentou em 9 pontos a sua expectativa de reeleição, o dólar aumentou sua cotação e os índices da bolsa americana subiram.
E mais: mataram a cobra e não mostraram o pau. Cadê o homem? Jogaram no mar, enrolado em branco, respeitando-lhe os rituais da crença... Que comédia é essa?
Por isso lembrei também de quando eles mataram o Che Guevara, este que hoje enfeita as camisas dos revolucionários ou pseudo-revolucionários (pelo menos ajuda a ganhar a mulherada na faculdade ou se passar por um “mente aberta”). A comemoração foi daí para melhor, com direito a troféu e tudo (como aqui bem os imitaram com a exposição do Marighela). Não estou comparando o Che com o Osama. Aliás, este cabra santo não era — como não é o Obama nem o Lula —, mas não posso aceitar que os Estados Unidos tomem nas mãos a soberania de países alheios, principalmente quando inventam motivos para destruir seus inimigos, às vezes, ex-aliados, às vezes, gente que sabe demais (ou de mais). Sempre tão culpados de tanta coisa, têm, a seu favor, o poder da imagem, o homem-aranha, os programas, Hollywood, a Coca-Cola, o Toy Story e, infelizmente, o Dr. Jivago, que originalmente é russo.
Quando os MacAmericanos, similares ao seu herói genocida Custer, invadiram o Iraque com a justificativa de acabar com as armas químicas, tipo assim, “Putz, foi mal, não encontramos, ó”, mesmo após tanta devastação, ainda fizeram desserviços à humanidade, como: saque de milhares de objetos do Museu do Iraque (entre eles, dezenas de esculturas assírias em marfim); a destruição de sítios arqueológicos sumérios (povo que inventou a escrita em 3.000 a.C.), por ação de bombas ou para serem transformados em heliportos e estacionamento de veículos militares; a perda do acervo de manuscritos sobre a civilização mesopotâmica, por incêndio da Biblioteca Nacional do Iraque no dia da conquista de Bagdá; danos ao Portão de Ishtar, a entrada principal da Babilônia, que resistiu à destruição pelos Persas no século VI a.C., mas que, ao povo norte-americano se rendeu.
 Cabe bem daí a nossa atenção. Pode ser que um dia eles cismem em nos tirar alguma coisa — nossos recursos naturais, por exemplo, que ninguém no mundo tem igual, mas que por aqui desperdiçamos — e, no afã de nos proteger de nós mesmos, será um salvem-se quem puder, We are the World, pois até parece que ninguém está conosco, se eles também não estiverem. 

And The End.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Velhos fatos, novos votos



Por estes dias escutei de uma paciente: “O ano já começou assim, com o povo se matando um ao outro.” O desgosto era visível no seu rosto, e a desesperança, evidente. A julgar pelos comentários ditos por amigos e lidos em jornais e redes sociais, a impressão é de que, exceto pelos bons momentos e conquistas, a maioria está farta – e com indigestão – do ano passado, sofrendo de amargo e doloroso refluxo de situações e conjunturas diversas, muitas delas agregadas sob o nome de “crise” (que, apesar de ter começado antes, ficou mais evidente em 2016). A insatisfação com os políticos em geral, independentemente de partidos, roubou o palco das indignações populares. Vem à lembrança, neste momento, o verbete “Política interna” do Dicionário Filosófico de Voltaire (Ed. Martin Claret, 2002), que começa assim: “Consiste em possuir em vosso próprio país o maior poder, as maiores honras e os maiores prazeres que forem possíveis. Só se consegue com muito dinheiro.”
Tais sentimentos foram em parte amenizados pelo combate à corrupção, que tem trazido de fato algo diferente no modo como as coisas são feitas no Brasil. E não é só por aqui. A Suíça, destino predileto de dinheiro desviado, começou a desmontar seu sistema de sigilo bancário neste início de ano. Espera-se que, apesar dos interesses contrários de certos poderosos, pelo menos algumas medidas eficazes nesse combate permaneçam firmes.
Neste começo de 2017, também se percebe um sentimento crônico agudizado de apreensão pelo que está por vir, bastante devido às propostas polêmicas que deverão ser votadas. Propostas que mexem com o bolso, com valores morais, com posições. A expectativa é de acaloradas discussões e protestos. Algo preocupante é com que base as pessoas vão debater e entender os debates sobre esses pontos.
Supõe-se que, para defender uma posição sobre dado assunto, um indivíduo tenha que possuir informações bem fundamentadas sobre a matéria em questão. Ainda mais quando se trata de significativas questões em votação. Mas parece que isso não é prática corrente em vários lugares. Um exemplo marcante, na verdade já muito difundido, é o da saída do Reino Unido da União Europeia – o famoso Brexit –, em junho passado. Sem entrar no mérito da decisão da maioria dos britânicos votantes, chamou a atenção que, após o resultado da votação ter sido anunciado, a segunda pergunta mais pesquisada por britânicos no Google foi “o que é União Europeia”. Se esse dado divulgado está correto, é perturbador imaginar o que várias dessas pessoas estavam considerando quando tomaram suas decisões.
Um termo curioso que, como a crise, já existia mas se evidenciou no ano passado, foi eleito pelo Dicionário Oxford “a palavra do ano”: chama-se post-truth, traduzido como “pós-verdade”, cujo conceito é: “que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”. Esse termo foi extensivamente aplicado ao Brexit e associado à vitória de Donald Trump e ao discurso de direita (como se fosse artimanha exclusiva de um grupo político). Não se trata aqui de discutir quais notícias são falsas, quais informações são boatos e por quais redes sociais, jornais ou revistas circulam. Esse fenômeno revela uma disposição e uma atitude mental perigosa para os debates saudáveis e as decisões conscientes. Parece que não importa o conhecimento, o saber, a objetividade. “Cada qual que se feche em seu mundinho e veja só o que quer ver.”

Conhecimento e sabedoria para discernir entre tantas informações. Este blog tem frequentemente abordado essa questão. Espero que faça parte de nossos votos, neste começo de ano (não deixemos só para depois do Carnaval!), buscar mais conhecimento e sabedoria. Vamos precisar!Por estes dias escutei de uma paciente: “O ano já começou assim, com o povo se matando um ao outro.” O desgosto era visível no seu rosto, e a desesperança, evidente. A julgar pelos comentários ditos por amigos e lidos em jornais e redes sociais, a impressão é de que, exceto pelos bons momentos e conquistas, a maioria está farta – e com indigestão – do ano passado, sofrendo de amargo e doloroso refluxo de situações e conjunturas diversas, muitas delas agregadas sob o nome de “crise” (que, apesar de ter começado antes, ficou mais evidente em 2016). A insatisfação com os políticos em geral, independentemente de partidos, roubou o palco das indignações populares. Vem à lembrança, neste momento, o verbete “Política interna” do Dicionário Filosófico de Voltaire (Ed. Martin Claret, 2002), que começa assim: “Consiste em possuir em vosso próprio país o maior poder, as maiores honras e os maiores prazeres que forem possíveis. Só se consegue com muito dinheiro.”
Tais sentimentos foram em parte amenizados pelo combate à corrupção, que tem trazido de fato algo diferente no modo como as coisas são feitas no Brasil. E não é só por aqui. A Suíça, destino predileto de dinheiro desviado, começou a desmontar seu sistema de sigilo bancário neste início de ano. Espera-se que, apesar dos interesses contrários de certos poderosos, pelo menos algumas medidas eficazes nesse combate permaneçam firmes.
Neste começo de 2017, também se percebe um sentimento crônico agudizado de apreensão pelo que está por vir, bastante devido às propostas polêmicas que deverão ser votadas. Propostas que mexem com o bolso, com valores morais, com posições. A expectativa é de acaloradas discussões e protestos. Algo preocupante é com que base as pessoas vão debater e entender os debates sobre esses pontos.
Supõe-se que, para defender uma posição sobre dado assunto, um indivíduo tenha que possuir informações bem fundamentadas sobre a matéria em questão. Ainda mais quando se trata de significativas questões em votação. Mas parece que isso não é prática corrente em vários lugares. Um exemplo marcante, na verdade já muito difundido, é o da saída do Reino Unido da União Europeia – o famoso Brexit –, em junho passado. Sem entrar no mérito da decisão da maioria dos britânicos votantes, chamou a atenção que, após o resultado da votação ter sido anunciado, a segunda pergunta mais pesquisada por britânicos no Google foi “o que é União Europeia”. Se esse dado divulgado está correto, é perturbador imaginar o que várias dessas pessoas estavam considerando quando tomaram suas decisões.
Um termo curioso que, como a crise, já existia mas se evidenciou no ano passado, foi eleito pelo Dicionário Oxford “a palavra do ano”: chama-se post-truth, traduzido como “pós-verdade”, cujo conceito é: “que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”. Esse termo foi extensivamente aplicado ao Brexit e associado à vitória de Donald Trump e ao discurso de direita (como se fosse artimanha exclusiva de um grupo político). Não se trata aqui de discutir quais notícias são falsas, quais informações são boatos e por quais redes sociais, jornais ou revistas circulam. Esse fenômeno revela uma disposição e uma atitude mental perigosa para os debates saudáveis e as decisões conscientes. Parece que não importa o conhecimento, o saber, a objetividade. “Cada qual que se feche em seu mundinho e veja só o que quer ver.”
Conhecimento e sabedoria para discernir entre tantas informações. Este blog tem frequentemente abordado essa questão. Espero que faça parte de nossos votos, neste começo de ano (não deixemos só para depois do Carnaval!), buscar mais conhecimento e sabedoria. Vamos precisar!